quarta-feira, 11 de janeiro de 2012

Os hinos do rugby

       A diferença entre um jogo de rugby e um de futebol começa já na hora dos hinos. Aquela imagem clássica dos boleiros fingindo que sabem a letra enquanto cantam com cara de quem peidou na missa é motivo de piada faz tempo. O desleixo dos jogadores e a banalização das convocações para a as seleções de futebol são os ingredientes para essas cenas desagradáveis. O fato de a letra do nosso hino ser difícil não serve de desculpa, basta ver os vídeos da seleção de rugby no youtube. Em São Paulo, há uma lei que obriga todo jogo de futebol a iniciar com o hino nacional. Talvez o legislador quisesse embutir o sentimento de patriotismo nos jogadores, mas o que vemos é um constante desrespeito ao hino, já que os atletas estão mais interessados (com razão) em não esfriar para o jogo. Hino obrigatório em jogo de clubes cheira a Getúlio Vargas.
      Nada melhor do que imagens para mostrar a diferença entre os esportes. Reparem na emoção do Messi ao cantar o hino de seu país e comparem com os jogares de rugby a seguir:



      Uma parte pouco explorada pelo filme Invictus, mas muito bem detalhada no livro Conquistando o Inimigo, de John Carlin, foi a disposição dos jogadores brancos sul-africanos em aprenderem a cantar a parte "negra" do novo hino nacional, o "Nkosi Sikelele". A poucos dias da estréia contra a Austrália, atual campeã, na competição mais importante de suas vidas, os jogadores reservaram parte do seu tempo para as aulas de canto arranjadas pelo organizador do time Morné Du Plessis. Detalhe que a parte a ser aprendida era em xosa, língua que desconheciam. Du Plessis sabia do impacto moral que a canção produziria em seu time e na torcida, reforçando o lema "um time, uma nação".
       Eis as palavras do capitão François Pienaar sobre a emoção do hino na final da Copa: "Não consegui cantar o hino, porque eu sabia que, se fizesse isso, ia desmoronar ali mesmo. Estava tão comovido que tinha vontade de chorar. Sean Fitzpatrick (capitão dos All Blacks) depois me contou que olhou para cima e viu uma lágrima rolar no meu rosto. Mas isso foi nada comparado ao que eu estava sentindo. Foi um momento de muito orgulho na minha vida, eu estava lá de pé e o estádio inteiro reverberava. Foi demais. Tentei localizar minha noiva, me concentrar nela, mas não consegui encontrá-la. Então fiquei mordendo o lábio. Mordi tão forte que senti o sangue descer pela garganta". Lendo essas palavras fica difícil imaginar que seria possível a África do Sul perder esse jogo tão importante. Depois de conhecer o papel que o rugby teve na construção de uma nova identidade para a África do Sul não dá para ficar indiferente a este vídeo:



      Há dois hinos entre as seleções de rugby que, apesar de não terem a beleza e emoção dos hinos francês e italiano, são os meus preferidos, pela bagagem histórica que carregam em seus versos. Trata-se do Ireland's Call e do Flower of Scotland, adotadas pioneiramente pelos selecionados locais de rugby.
Bandeira utilizada pela Federação Irlandesa de Rugby
   Segundo o Wikipedia, o Ireland's Call foi escrito por Phill Couter, em 1995, a partir de um pedido da Federação Irlandesa de Rugby, que agrupa na mesma equipe jogadores da República da Irlanda e da Irlanda do Norte. Como diplomata não posso dar minha opinião sobre essa divisão da ilha, mas como jogador de rugby acho que o time da Irlanda é muito melhor unido do que separado. O fato é que quando joga em Dublin, a Irlanda canta dois hinos, o seu tradicional Amhrán na bhFiann e também o Ireland's Call. Nos jogos no exterior, canta-se exclusivamente o Ireland"s Call, para evitar sensibilidades. Acho a letra bem representativa do espírito de se juntar as 4 províncias irlandesas no mesmo time:

Come the day and come the hour
Come the power and the glory
We have come to answer
Our Country's call
From the four proud provinces of Ireland

Refrão:

Ireland, Ireland
Together standing tall
Shoulder to shoulder
We'll answer Ireland's call

From the mighty Glens of Antrim
From the rugged hills of Galway
From the walls of Limerick
And Dublin Bay
From the four proud provinces of

Refrão

Hearts of steel
And heads unbowing
Vowing never to be broken
We will fight, until
We can fight no more
From the four proud provinces of Ireland

Refrão


     Já a Escócia, por pertencer ao Reino Unido, não tem hino oficial, mas a seleção de rugby adotou o Flower of Scotland antes das partidas. De fato, seria estranho ver Inglaterra e Escócia cantarem juntas o God Save the Queen antes de um jogo com tanta rivalidade.
     Escrita em 1965, Flower of Scotland faz referência à vitória dos escoceses sobre os ingleses na batalha de Bannockburn, em 1314, quando o exército de Robert de Bruce derrotou as tropas de Eduardo II. A primeira vez que foi cantada foi justamente num jogo decisivo entre Escócia e Inglaterra no 5 nações de 1990. (Viva o Wikipedia!) Para quem gosta de Coração Valente como eu, a música é de arrepiar. Eis a letra da música que hoje é conhecida como o hino não oficial escocês:


O Flower of Scotland,
When will we see your like again
That fought and died for
Your wee bit hill and glen.
And stood against him,
Proud Edward's army,
And sent him homeward
To think again.

 The hills are bare now,
And autumn leaves lie thick and still
O'er land that is lost now,
Which those so dearly held
That stood against him,
Proud Edward's army
And sent him homeward
To think again.

 Those days are past now
And in the past they must remain
But we can still rise now
And be the nation again!
That stood against him
Proud Edward's army
And sent him homeward
To think again.

O Flower of Scotland,
When will we see your like again
That fought and died for
Your wee bit hill and glen.
And stood against him,
Proud Edward's army,
And sent him homeward
To think again.


   Aqui estão os vídeos para acompanhar:

Irlanda

Escócia
      
Itália

França

Brasil


Para quem quiser saber mais sobre as implicações políticas do rugby na Irlanda, compartilho esse artigo da Economist:
http://www.economist.com/blogs/gametheory/2012/03/rugby-ireland

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