sexta-feira, 19 de dezembro de 2014

E a bicicletaria do seu Pedro fechou



Eu e o Jovem


Uma das primeiras lembranças que tenho da infância foi o dia em que aprendi a andar de bicicleta. A rua cheia da molecada do bairro jogando folhas pro alto, meu pai dando o empurrão inicial e aquele misto de adrenalina, aventura e felicidade que sentimos neste momento tão especial nas nossas vidas. Lembro direitinho daquela chuva de folhas secas na rua, porque o mais novinho da turma estava andando sem rodinha pela primeira vez.
Desde essa minha primeira bicicleta, todo pneu furado e peça quebrada eram arrumadas na bicicletaria do "Jovem". Na verdade, nunca soube o nome do estabelecimento, mas chamávamos assim porque o seu Pedro, dono da bicicletaria, chama a todos de jovem. Teve uma época que desconfiei que meu pai ia lá só pra ser chamado de jovem.
Quando comprei a primeira bicicleta pro meu filho, fui com meu pai e ele na bicletaria do jovem arrumar. Foi um encontro geracional muito emocionante. 
Nesta época, ainda ficava numa esquina apertada, com bikes saindo pela janela. Lá de dentro, em meio a peças e bicicletas, emergia o seu Pedro, com sorriso nipônico de felicidade, chamando nós três de jovens. 
No último ano, com a volta da minha paixão por bikes, voltei a frequentar mais constantemente a bicicletaria, que havia se mudado para duas esquinas aos lado, num lugar mais amplo.
Seu Pedro arrumou a bicicleta pro meu primeiro triatlhon e também pra prova de 6h de mountain bike que participei.  Adorava ouvir as histórias das provas longas e falava "cê é louco, jovem", apesar dele mesmo já ter ido pra Caraguá e Campos do Jordão de bicicleta.
Na última vez que fomos lá, levei meu irmão, que não lembrava de lá, pra montar a bicicleta nova dele e ele ficou maravilhado. Voltou mais umas duas vezes. O Seu Pedro, no entanto, já havia dito que se mudaria, pois estavam assaltando muito no bairro.
Hoje, quando fomos de novo, eu, meu irmão e meu filho, nos deparamos com um recado na porta, que quebrou nosso coração. O Jovem encerrou as atividades depois de 20 anos. A melancolia tomou conta do carro, e rumamos pra arrumar a bike na Decathlon, entregues ao capitalismo da loja gigante, com saudade da tradicional bicicletaria do bairro.
O recado na porta
O bom que sabemos que o Seu Pedro está com saúde, apenas se aposentou, depois de ter formado os filhos com o trabalho na bicicletaria, como orgulhosamente nos contava. 
Ale e sua bike da Decatlhon, onde aprendeu a andar sem rodinha em em meio a prateleiras de produtos



quarta-feira, 23 de abril de 2014

Estreiando no Triathlon: X Terra Paraty

Depois de muitos meses de natação e alguns de ciclismo, chegou a vez de juntar tudo e participar da minha primeira prova de triathlon. Tinha me inscrito no XTerra Paraty por apresentar distâncias não tão longas, o que pensei que poderia ser um bom começo. Estavam previstos 1,5K de natação, 29K de ciclismo e 7,5K de corrida. O problema é que o ciclismo seria mountain bike e eu não estava nada preparado pra o que estava por vir.
O primeiro desafio foi preparar a mala antes de viajar. Meu medo era esquecer algum item essencial para alguma das três etapas. Quando era só corrida era tão mais fácil arrumar a mala...
E apesar de levar tudo certinho, na prova você fica se sentindo muito iniciante ao ver os participantes com todos os itens de triathlon que você ainda não tem. Como o investimento é muito alto, vou comprando aos poucos e ajustando o que dá. A bike foi da minha cunhada Ana, a quem muito agradeço!
A natação, que sempre foi minha maior preocupação, foi tranquila. Sabia que eu não ia ser rápido, então minha alegria foi não terminar muito atrás e terminar bem fisicamente. O mar estava uma maravilha para nadar, sem ondas e raso até demais.
 A transição pra bike também foi boa. Consegui fazer rápido, só que vi que muita gente já havia saído de bike e tentei me tranquilizar.
Na parte do ciclismo foi que o bicho pegou. Eu já tinha feito uma prova de Mountain Bike de 21Km no Paraguai e sabia que seria duro, mas não esperava um trajeto tão técnico e tão cheio de subidas.
 Os primeiros quilômetros foram bem e consegui colocar um ritmo legal, fazendo algumas ultrapassagens. Depois, foi morro atrás de morro. Pelos meus cálculos, passei quase 40% do tempo empurrando a bicicleta morro acima. Um saco! Fiquei de muito mau humor. O pessoal que estava ao meu lado também começou a reclamar muito. Imagino que pros primeiros colocados deve ter sido legal um percurso difícil deste, mas pra galera que ficou lá trás como eu ficou uma ponta de decepção por ter que levar a bike na mão por tantas partes do trajeto. Tombos eu levei quase 10, principalmente por não conseguir tirar a sapatilha a tempo do pedal. Derrubei um cara também sem querer e fiquei muito preocupado de tê-lo machucado ou quebrado a bike, mas ficou tudo bem. Minha corrente enroscou na catraca e, depois do último tombo, a marcha parou de mudar! Tudo isso era menos pior que furar o pneu, eu pensava, e continuei a pedalar. O grande problema pra mim foi que, além de perder muito tempo de prova subindo a pé empurrando a bicicleta, acabei gastando muito a perna e tirando forças pra minha melhor parte, que seria a corrida.
O trajeto não acabava nunca e comecei a me preocupar em estourar o tempo limite pra entrar na área de transição, uma vez que meu relógio também quebrou.
Demorei tanto na parte do ciclismo que, quando cheguei na transição, meu irmão perguntou se eu tinha errado o caminho rs.
 A definição da mountain bike pra mim foi uma máquina de moer carne. Ela acabou com minhas energias, meu humor e minha moral pro resto da prova.
Quando saí pra corrida, comecei a correr com raiva e tentei imprimir o ritmo em que estou acostumado a correr, mas só consegui até o segundo quilômetro. Depois, corri do jeito que deu, torcendo pra acabar logo. Ao final, foram 3h40min de prova. Não estava preparado psicologicamente para tudo isso. Por sorte levei doce de banana o suficiente pra comer durante a prova.
A torcida dos amigos e parentes na transição ajudou bastante. Saber que eles estavam lá me esperando deu ânimo para terminar a prova.
Nos quilômetros finais da corrida, lembrei muito do livro que estou lendo, sobre o corredor olímpico norte-americano Louis Zamperini. Após 43 dias sobrevivendo num bote no mar, depois de seu avião ser abatido na Segunda Guerra, ele passou mais de dois anos sofrendo em campos de prisioneiros mantidos pelos japoneses. Sua família já recebera a notícia de que ele estava morto. Ao final da guerra, quando souberam que ele estava vivo, seu pai falou: "Eu sabia que aqueles japoneses não iam quebrá-lo. Meu filho é um cara durão".
Essa frase ficou na minha cabeça a corrida toda. Eu sempre leio livros sobre pessoas em situações extremas, porque ajudam a colocar em perspectiva as pequenas dificuldades que enfrentamos em algumas provas.
Eu queria ser um cara durão, queria  terminar aquela prova!




Fui o 88 colocado em 120 homens, mas agora posso dizer que sou um triatleta! Valeu a pena o perrengue.

segunda-feira, 24 de março de 2014

Correr sem saber o resultado


Ontem fui assistir a uma corrida feminina em Assunção e, na hora da premiação, foi aquele rolo. O sistema de cronometragem claramente não funcionou e começaram a premiar equivocadamente corredoras que chegaram depois das verdadeiras ganhadoras. Houve muita reclamação e resolveram, por fim, suspender a premiação até que resolvessem o problema todo. Isso também já havia me passado num duathlon aqui. Fui embora só imaginando minha colocação, sem saber exatamente como fui.
No Facebook da empresa que organizou a corrida, além de muitos protestos, há pessoas defendendo a empresa, afirmando que a corrida era apenas uma diversão e que as pessoas poderiam controlar seu próprio tempo. Esse debate me pareceu muito interessante. Realmente corremos só por resultados? Depende!
Neste mês participei de uma corrida beneficente em prol de uma corredora que está hospitalizada. Desde o começo, os organizadores afirmaram que a corrida era simbólica e que, por isso, não haveria premiação, apenas sorteio de brindes. Fiz minha melhor corrida em muito tempo, chegando em 5° lugar. Na chegada, nem premiação, nem linha de chegada, nem nada. É meio estranho, mas era o combinado e, sobretudo, era por uma ótima causa. Não era porque não haveria troféu que deixaria de dar meu melhor. Corri por resultado sim, mas não pelo reconhecimento dele.
Agora, é muito diferente quando você se prepara para uma prova competitiva, em que há premiação para as diversas categorias. Quem treina sabe o quanto visualisamos o dia da prova em nossa cabeça. Quando o corpo está pedindo arrego, nosso cérebro nos lembra que cada treinamento tem um motivo específico: você quer emagrecer, você quer completar uma prova, você quer baixar seus tempos ou você quer chegar entre os primeiros da corrida.
O erro de cronometragem não é apenas um detalhe numa corrida "muito divertida e bem organizada" (palavras de algumas corredoras) como foi a corrida feminina. Se você coloca pessoas para competir e as vende este produto, a falta de resultados é um desrespeito tremendo com quem se preparou. Mais desrespeito ainda é premiar quem chegou depois de você, como foi o que aconteceu ontem. 
Uma das participantes, que acho melhor não chamar de "corredora", afirmou até que era falta de humildade as pessoas reclamarem de não ter o resultado correto. Falta de humildade? Querer ganhar no esporte agora é ruim? Vamos todos ser humildes e correr mais devagar que o próximo...Acho que ela não entendeu bem o espírito das reclamações porque não sabe o quanto é frustrante ver seus objetivos perdidos por uma má organização da prova. 
A corrida é democrática justamente porque engloba todos os tipos de objetivo, desde apenas completar a prova até chegar entres os primeiros. Mas se você, organizador, quer atingir apenas o primeiro grupo, deixe isso claro na inscrição. 
Correr sem se preocupar com resultados também é legal, mas para mim funcionou por ser uma causa nobre. Sou corredor porque gosto de competir, mesmo que não chegue entre os primeiros.

terça-feira, 18 de março de 2014

Estreiando no Biathlon: Rei e Rainha do Mar 2014



 



Domingo foi dia de fazer as pazes com o mar. Depois da experiência não muito feliz da minha primeira travessia marítima (http://caipirajovem.blogspot.com/2013/12/fuga-das-ilhas-2013.html) , resolvi encarar de novo um desafio no mar como preparação pro Ironman 70.3 de Foz do Iguaçu, no final de agosto.
Inscrevi-me no Beach Biathlon do Rei e Rainha do Mar, no Rio, que teve 1,5K de natação e mais 2,5K de corrida na areia, saindo do posto 12 do Leblon e terminando no Arpoador. Foi uma ótima oportunidade para nadar de novo e testar minha corrida na primeira prova de esportes combinados da minha vida.
Tenho feito aulas de Crossfit e, em algumas delas, há treinamentos de resistência, que combinam exercícios físicos com tiros de corrida. Eles têm sido muito úteis para acostumar meu corpo a correr cansado. Para quem veio da corrida, como eu, e quer começar no triathlon, a idéia de iniciar a corrida já tendo feito outra atividade é completamente nova. Tenho treinado acostumar pernas e, principalmente, a cabeça, de que meu ritmo na corrida será outro daqui pra frente, não àquele de um corredor descansado na hora da largada da prova.
Antes da prova, tomei uma precaução que fez toda a diferença. Como havia passado muito mal na última travessia pelo enjôo que sofri no mar, consultei um médico sobre algo que poderia tomar. O remédio foi milagroso e não senti absolutamente nada desta vez. Nadar sem passar mal já foi uma vitória em si.
Desde a retirada dos kits, no sábado, o comentário geral é que teríamos prova com o mar bastante calmo, o que me aliviou. Depois de nadar numa “máquina de lavar” na Barra do Sahy, queria experimentar um mar calmo. Disseram até, em tom solene, que foram vistas baleias no mar do Leblon naquele dia. Não entendi a relação das baleias com a prova, mas confesso que nadei com aquilo na cabeça. Sempre quis nadar com uma baleia, mas e se ela me pegasse?
Na hora da largada, conferi chip, touca, óculos e vaselina, nas pernas e nos braços, para evitar a fricção na hora da natação e da corrida. Resolvi nadar de sunga, na verdade por falta de opção, mas muita gente nadou com roupa de natação e dizem que faz uma boa diferença. Preciso comprar uma, mas como diz aquele ditado pra quem começa no Triathlon: ”bem-vindo ao triathlon, agora vocês está falido”. O jeito é ir comprando os itens aos poucos.

Resolvi testar meus outros óculos desta vez, um mais parecido com uma máscara. Apesar de a recomendação ser utilizar óculos com vidro polarizado em dias de sol, fui com meu óculos de lente clara, porque para mim é mais fácil enxergar com ele. Já sou míope, aprendendo a me guiar no mar, e ainda ter que ver tudo meio escuro?!
Dada a largada, esperei o pelotão sair em disparada para depois encontrar calmamente meu lugar no mar. Outra mudança de hábito da corrida, em que gosto de sair sempre com o pelotão de frente. Na natação, se você não tem velocidade, sair na frente é participar de um festival de socos e pontapés, involuntários ou não.
Os primeiros metros até fazer a curva na bóia foram novamente duros. Nadar contra as ondas não é fácil e engoli muita água. Acontece de tudo nos metros iniciais. Você está rodeado de gente, o mar vem contra, seu corpo balança de mais, seu corpo ainda está processando que você vai começar uma atividade física. Uma confusão de sentimentos que mexe com a cabeça. Fiz uma coletânea das frases que meu cérebro me disse nesses metros iniciais da prova:
- Que m****, não consigo nadar mesmo no mar!
- B****, paguei caro na inscrição do ironman e não vou aprender a nadar até lá.
- Investi na bike e nunca serei um ironman! Talvez possa fazer umas provas de duathlon, vai ser divertido. É só bike e corrida, mais legal que nadar.
- Acho que vou desistir, é mais prudente. Pega nada, as pessoas não vão me julgar por isso.
Enquanto meu cérebro fazia esse jogo sujo, continuei nadando até alcançar a segunda bóia, quando a prova então virava uma linha reta até a última bóia, em que viraríamos em direção à praia pra começar a correr.
Em algum momento, que não sei explicar por que, comecei a curtir a prova. Olhava para os lados e o visual estava incrível. A visão do alto mar com muitas pessoas nadando ao seu redor é algo que recomendo para todos que gostam de esporte. É realmente de arrepiar e agradecer por estar ali.
A organização colocou, durante todo o trajeto, monitores da prova em stand up paddles, com cores bem chamativas. Eles foram ótimas referências para mim. Sem saber me direcionar muito bem ainda e sem ver as bóias de muito longe, conseguia me guiar pelos monitores e pelas pessoas ao meu redor. Fiquei feliz em ajudar um nadador que cruzou perpendicularmente meu caminho, mostrando a direção correta. Estava evoluindo!
Após cruzar a última bóia, era hora de chegar na praia e começar a correr. Me esforcei ao máximo para acelerar o nado nestes metros finais de natação e, quem sabe, ganhar umas posições pegando jacaré na onda. Lembrei de por em prática uma dica que vi num blog e tratei de movimentar meus pés e tornozelos circularmente para prepará-los para o impacto da corrida.
Fiz os 1,5K em 31 minutos. Fiquei feliz, porque era o que eu estava programando mesmo. Ainda tenho muito a melhorar, mas só de chegar inteiro na transição já foi uma alegria e tanto.
Correr depois de nadar e correr na areia são duas atividades que este caipira aqui ainda não havia feito na vida. As sensações eram duas basicamente: 1) agora é hora de tirar o atraso da natação e mostrar para que veio, vamos correr! 2) Esse corpo não é meu, essa perna não é minha, ta tudo doendo, quero correr mas esta areia não deixa!
Esses 2,5K na areia foram bem interessantes e um aprendizado muito importante, principalmente para a mente, que reclamou muito de o corpo não atingir a velocidade habitual que tenho na corrida.
Consegui ultrapassar bastante gente, poucos da minha categoria na verdade, que tem média de natação muito melhor que a minha e que eu não teria como compensar com essa quilometragem pequena de corrida. Fiz os 2,5K em pouco menos de 11 minutos.
Para mim, o mais importante do Rei e Rainha do Mar foi que me devolveu a confiança de nadar no mar. Pude realmente desfrutar da prova e fiquei com vontade de voltar e nadar distâncias maiores.
Fiquei muito impressionado com a organização e recomendo a segunda etapa, em agosto, para todos. Junto com o Biathlon, organizaram uma corrida de 5K na areia, provas de stand up paddle e provas de 1K, 2K e 3,5K de natação. Tudo com muito suporte, segurança e, claro, alegria.
Agora, volto a encontrar o oceano em abril, no X Terra Paraty, minha estréia no triathlon. Vamos que vamos!

quarta-feira, 8 de janeiro de 2014

Fuja da televisão e faça você mesmo

           Estava lendo o livro "The Sports Gene", de David Epstein, para saber mais sobre genética esportiva (óh, jura Pc?, pensei que fosse culinária ou direito marítimo) e me deparei com um conceito que, se me lembro bem, o autor chamou mais ou menos de "piramidização dos eventos esportivos". Epstein argumenta que nos últimos anos, com o aumento dos patrocínios e da exposição na mídia dos grandes eventos esportivos, houve uma concentração enorme de prêmios em dinheiro e de remunerações no topo da pirâmide, para atletas como Tiger Woods, Usain Bolt e Neymar, e sobrou pouco para você, para mim e para o lateral esquerdo do futebol de várzea da sua cidade, que estamos na base da pirâmide esportiva. 
"Ah, então você quer ganhar dinheiro nessas suas corridinhas de final de semana, Paulo Cezar?"
           O problema maior disso não está apenas em ganhar ou não prêmios monetários em corridas, até porque com minhas colocações não daria pra cobrir nem o valor da inscrição. O drama da situação atual reside no fato de que, com o dinheiro investido no esporte concentrado em grandes atletas (que conseguem mais exposição mundial pela TV e geram obviamente mais renda e propaganda) estão diminuindo os incentivos a atletas amadores. E, segundo Epstein, não é só pela grana, mas pelo prestígio. Se eu posso ficar em casa e ver ao vivo na TV o Messi driblar meio time adversário de uma forma fantástica, isso não é melhor do que eu tentar jogar meu futebolzinho sem graça? O autor, no caso, fala sobre uma legião de Quaterbacks frustados que deixam de jogar em suas cidades porque o espetáculo provido pela Tv tem apelo muito maior. Nessa parte creio que o conceito de BIRGing (Basking in reflected glory), que tratei em outro texto, se encaixa muito bem. BIRGing é a associação que um indivíduo faz com o sucesso de outro de tal maneira que aquele sucesso seja sentido como seu também. Eu, com a camisa do Barcelona em casa, me sinto fodão porque o Messi fez quatro gols.
            Não era assim com as gerações passadas. Cresci ouvindo história do meu pai e dos meu tios sobre os gloriosos dias do futebol amador de Itajubá, em que o estádio ficava cheio pra ver os times da casa jogarem. Claro que eles gostavam de assistir os jogos do Botafogo e os lances do Pelé, mas como a facilidade não era a mesma que hoje, o jeito era fazerem eles mesmo o campeonato local para se divertir. E isso se reproduzia em todos os esportes. Com a TV mostrando ao vivo o Usain Bolt, ninguém se interessa em ir presenciar o cara mais rápido da sua cidade contra o cara mais rápido da cidade vizinha.  
"Ah, então você está falando que a tecnologia que nos permite ver ao vivo o Bolt é ruim e que seria melhor assistir a Chico Bento x  Zé Lelé na minha cidade"?
          Não, ela é ruim à medida que te desincentiva a dar o seu melhor e terceiriza sua glória e realização pessoal.
              E que fique claro que não é só a TV, pois a internet nos permite viajar sem sair do lugar, ser agricultor sem plantar sementes, ser soldado sem saber da tiro, etc...
           Hoje li o texto "6 verdades chocantes que irão fazer de você uma pessoa melhor", no link http://www.libertarianismo.org/index.php/artigos/6-verdades-chocantes-que-irao-fazer-de-voce-uma-pessoa-melhor/
              O texto começa com o autor pedindo pra que listemos 5 coisas impressionantes sobre a gente mesmo e segue na linha de "depende só de você ser uma pessoa mais interessante, mas isso custa tempo então saia da inércia comece logo".
              Numa parte da sua argumentação, o autor afirma que muitos vivem se perguntando “Como eu consigo que garotas bonitas gostem de mim?” ao invés de “Como eu posso me tornar o tipo de pessoa que garotas bonitas gostam?”. Essa parte do texto tem tudo a ver com um filme que vi esse final de semana e me fez pensar muito na vida, chamado "A Vida Secreta de Walter Mitty". Walter é um funcionário apagado e sem graça de uma revista e vive tendo ilusões com aventuras que façam com que sua amada lhe dê atenção. Ao longo do filme, ele acaba tendo que participar realmente de aventuras e vai parar num vulcão da Islândia, num helicoptero na Groelandia e até mesmo no Afeganistão. Ao atualizar seu perfil numa rede de namoro na internet com esses fatos novos, Mitty se torna objeto de desejo das mulheres e ganha a admiração de sua amada. É a consagração da história "faça você mesmo coisas espetaculares que se tornará uma pessoa melhor e conseguirá o que quer".
              Meus últimos três meses, com o joelho machucado, foram de muitas horas de televisão. Se tivesse que listar coisas impressionantes sobre mim nesse período poderia dizer: 1- Vi um cara ganhar um Tour de France, na ESPN 2 - Vi uns caras subindo o Everest, no Discovery 3- Vi um capitão ser sequestrado por piratas, no Cinema, etc..   
               Com a forma física recuperada, prometi a mim mesmo que a TV será só de vez em quando e que iria parar de reclamar da vida. Comecei a treinar mais, a aceitar mais convites pra sair de casa e a parar de ter preguiça de sair do sofá e procurar algo legal pra fazer.
             Não sei como dizer isso sem ser constrangedor, mas acredito que as coisas nessa vida são como filme erótico: por mais que seja muito legal ver na TV e que a atriz seja linda, é muito melhor fazer você mesmo.
              Não é um lema que você possa escrever na parede da sua casa, mas com ele em mente você poderá dizer, quando chegarem seus últimos dias, "fiz mais do que vi gente fazendo".