Em discurso na Universidade de Auckland, na Nova Zelândia,
o Secretário Geral da ONU, Ban Ki-Moon, comparou o rugby à diplomacia. O SG da
ONU estava no país para participar do encontro de líderes dos países insulares
do Pacífico, reunião marcada "coincidentemente" junto com o início da
Copa de Mundo de Rugby.
Moon afirmou que o rugby e a diplomacia, apesar
de não parecer, têm coisas em
comum. Segundo ele "no rugby você perde o dente; na
diplomacia, a face". A frase, que soa estranho em português, vem da expressão
inglesa muito utilizada no mundo diplomático "to lose face", que
significa algo como "perder o status ou ser menos respeitado pelos demais
ao agir de maneira incorreta".
O Secretário Geral continuou suas comparações:
"No rugby, o scrum confunde qualquer um que não conheça o jogo. Assim
também ocorre com os debates da ONU. Às vezes os dois parecem muito
similares." Concordo plenamente, apesar de achar o scrum muito mais
compreensível do que os debates da ONU.
Em tom mais sério, afirmou que vê, no rugby,
valores e um estilo de vida bem úteis para o mundo da diplomacia: trabalho em
equipe, respeito mútuo, solidariedade, garra e determinação.
Se a guerra é a continuação da diplomacia
por outros meios, o rugby é a realização de uma batalha por meios mais
diplomáticos. Apesar do contato físico intenso na defesa e conquista do
território, o rugby se vale de regras extremamente rígidas no que se refere às
agressões. O respeito às regras pré estabelecidas e a rigidez no trato com o
árbitro, necessários para evitar que o esporte descambe para a violência, são componentes
que faltam na sociedade internacional. Se a ONU tivesse o poder de um juiz de
rugby e não de um de futebol, para o qual todos correm reclamando, haveria
certamente menos desordem nas relações internacionais.
Por falar em rugby e diplomacia, o esporte já
prestou importante papel nas relações internacionais. No livro "Esporte,
Poder e Relações Internacionais", o diplomata Douglas Wanderley de
Vasconcellos discorre sobre a conclamação que fez a ONU, em 1976, aos países
membros para cortaram relações esportivas com a África do Sul devido ao regime
de segregação racial. A seleção de rugby da Nova Zelândia, no entanto, não
respeitou o pedido e fez excursão ao país, o que levou os outros países do continente
africano a pedirem a exclusão da ilha do Movimento Olímpico Internacional. Por
não terem sido atendidos, os países africanos boicotaram os jogos olímpicos de
1976, realizados em
Montreal. O final do regime da apartheid e a volta da África
do Sul ao cenário esportivo mundial ficaram nacionalmente conhecidos com o
filme Invictus.
Na útlima Copa do Mundo de Rugby, realizada na
Nova Zelândia, o imbróglio diplomático foi causado pela possível presença de
jogadores militares na seleção de Fiji, país comandado por uma ditadura militar
não reconhecida pela Nova Zelândia.
A parte mais interessante sobre rugby no livro citado anteriormente,
no entanto, são as cartas do Barão do Rio Branco sobre o rugby. Seu filho,
Paulo do Rio Branco, jogou no Stade Français e permanece até hoje como o
jogador de rugby brasileiro mais bem sucedido no exterior, com 6 títulos de
campeão francês. Vamos a frase do Barão sobre o rugby, que consta de carta
escrita em 1896: "Esse gênero de esporte deveria ser introduzido no seu
Rio Grande, em Santa
Catarina, Paraná, São Paulo e Minas Gerais, onde o clima
permite tais exercícios”. Para quem era craque em disputa de territórios e
demarcação de fronteira, nada mais natural do que a admiração pelo rugby. Ainda que de forma indireta, hoje o Barão veria seu nome num dos principais time de rugby do Brasil, o Rio Branco, de São Paulo.
Sobre seu filho, descreveu o patrono da
diplomacia, na carta encontrada pelo autor do livro: "Meu filho Paulo,
estudante de Medicina, é o arrière (zagueiro) da equipe francesa, sendo tido
como o melhor do país. No mundo dos esportes atléticos, aqui, chamam-no Da
Sylva, estando-lhe confiada a última defesa do campo quando os ingleses
forçarem – como hão de forçar – as três linhas de avantes, demais e
trois-quarts. Ontem o Paulo atirou ao chão todos os ingleses que pôde, até
cansar, mas eles são muito superiores aos franceses em disciplina e na arte de
passar o balão. Aquele que era atirado ao chão pelo Paulo lançava o balão a
outro inglês muito distante, e este, sem encontrar franceses, porque todos
perseguiam o primeiro, fazia o ponto."
Pela carta, pode-se depreender que Paulo jogava
de fullback, numa época em que o rugby tinha uma cara diferente da atual.
Termino o texto com um link para uma reportagem
do SPORTV sobre o projeto do Rugby sem Fronteiras, instituição argentina que
organizou uma partida entre argentinos e os habitantes das Malvinas.