Tão zureta que fiz 24 pra câmera, em vez de 42k |
“Se você quer correr, então corra uma milha. Se você quer experimentar uma outra vida, corra uma maratona.”
Emil Zatopek
Correr uma maratona sempre foi um objetivo na
minha vida, como são aquelas clássicas promessas de plantar árvore, ter filho e
escrever um livro. Mas era um objetivo que nunca contou com nenhum planejamento
sério, até eu começar a correr com a chegada dos 30 anos. Depois de abandonar o
rugby e treinar de verdade para corridas de rua, o sonho da maratona foi começando a aparecer com mais claridade no horizonte e se realizou em 4 de agosto de 2013, precisamente às 10:11 da manhã,
quando cruzei os 42k e 195
metros da Maratona de Assunção, após 3h11m54s de
corrida.
Desde que comecei a treinar, sempre tive a
maratona na cabeça. Em todas as provas e treinos que fazia eu só ficava
imaginando como seria legal poder completá-la. Pois bem, depois da Meia
Maratona de Assunção e da Meia das Cataratas em maio, me empolguei e quis
adiantar os planos para poder correr a maratona de Assunção ainda em 2013.
Creio que poderia ter esperado um pouco mais para fortalecimento muscular, mas
o simbolismo de conquista que a corrida representava para mim falou mais alto e
quis arriscar mesmo assim. Queria que minha primeira fosse aqui em Assunção,
cidade em que comecei a correr. Havia também um fator prático muito forte, que
era o fato de correr na cidade em que moro, já que sabia que estaria muito
cansado depois da corrida. Correr a primeira em Nova Iorque, Berlim,
ou Chicago seria muito legal, mas prefiro ficar destruído em casa do que num
quarto de hotel!
Os treinos pré-maratona foram os mais divertidos
até hoje. A sensação de sair de casa bem cedinho e percorrer boa parte da
cidade é muito gostosa. Nos três treinos longos que fiz (21k, 24k e 32k), saí
de casa às 7h no domingo e pude reparar em detalhes que nunca havia visto,
tanto quando corri em São
José dos Campos quanto em Assunção. Agora,
eu era um daqueles caras que você, que teve que acordar cedo por algum motivo,
vê correndo domingo bem cedinho na cidade e se pergunta: Por que esse idiota
não está dormindo?
A ansiedade durante os treinos foi imensa. Já
estava ficando mal-humorado porque não chegava logo o dia da corrida. Acho que
o que eu queria mesmo era provar logo pra mim que eu podia completar os 42km.
Como na semana anterior à maratona você tem que diminuir o ritmo de treino,
isso só aumentava mais a vontade de correr.
Quando finalmente chegou o dia, lá está eu na
largada para os meus primeiros 42K. Baseado nos tempos que vinha fazendo nos
treinos e provas, imaginei fazer a prova perto das 3 horas. Objetivo bastante
audacioso para minha primeira maratona, mas não deixava de ser próximo do ritmo
que havia feito durante os treinos. O problema é que faltou combinar isso com
os quilômetros finais...
Na largada, faltando uns 3 minutos pra começar,
puxei papo com um brasileiro do meu lado. O Helbert estava na sua 15a maratona,
a 5a em 90 dias. Perguntei como seria o ritmo dele e me falou que estava
pretendendo terminar em 3h05. Fiquei meio sem graça de dizer queria segui-lo
então, mas foi o que fiz logo no segundo quilômetro de prova. Ele foi muito
gente fina e se dispôs a conduzir o ritmo da prova. Em troca, fui apresentando
a cidade pra ele.
A primeira dica do Helbert foi: beba água em todos
os postos de hidratação, mesmo sem sede!
Ai estou eu seguindo a dica, logo atrás dele:
Os primeiros 10K foram num ritmo abaixo do que eu
gostaria e fiquei me perguntando se deveria apertar o passo. Só ouvi um
"não faça isso, vai se arrepender depois" do meu parceiro rs. Ok,
segunda dica observada.
Terminamos a primeira metade com 1h32 pelo que me
lembro, um ritmo excelente e dentro das expectativas. Nesta parte da prova, bem
quando cruzamos o 21°KM, ultrapassamos uns 5 ou 6 corredores. O Helbert falou em
tom de brincadeira "estes são corredores de meia maratona, daqui pra
frente é que veremos quem é maratonista mesmo". Ali tinha começado a
corrida psicologicamente. Eu estava bem, com o pé doendo um pouco na pisada,
mas tive a certeza que iria completar aquela prova.
A partir do 25K, a prova voltava pro seu local de
origem e teríamos que repetir praticamente todo o trajeto da primeira parte.
Essa parte achei bem complicada, porque você consegue ter claramente na cabeça
toda a distância que ainda há por percorrer e isso desanima um pouco.
As conversas foram ficando mais raras e me
concentrava só em não diminuir o ritmo para conseguir acompanhá-lo e terminar a
prova perto das 3 horas.
O plano estava saindo perfeitamente bem, até o
35K. Estava bem alimentado, com energia, disposição e nenhuma parte do corpo
doendo muito. Porém, quando tive que fazer uma curva de 180°, mais conhecida
como cotovelo, diminuí muito o ritmo e o corpo sentiu o cansaço. Segui o Herbet
por mais 2Km e depois tive que diminuir e vi meu parceiro de corrida indo
embora.
Do 36K até o final, tenho que confessar: a
maratona não teve graça nenhuma pra mim. Cada pisada doía muito o pé e a batata
da perna. A vontade de estar em casa no meu sofá era gigantesca.
Quando corria provas anteriores, na hora que a
dor e o cansaço apertavam eu me concentrava no fato de que estava me preparando
para correr uma maratona. Ficava imaginando como seriam emocionantes os kms
finais e isto me confortava. Agora que estava justamente nos kms finais da
maratona, nenhum pensamento conseguia me confortar. Tentei de tudo: pensei no
meu filho, na família, na melhora de vida que tive correndo, na massagem pós
prova...nada adiantava. No livro do Murakami, "Do que eu falo quando falo
de corrida", ele diz que prometeu nunca mais correr uma maratona depois
que terminou a primeira, de tão cansado que ficou. Eu, quando li, achei
exagero, mas nestes kms finais fui além, prometi que nunca mais iria nem
correr!
Quando treinava, achava que iria chegar
triunfante "à la
Rocky Balboa" na linha de chegada da maratona, mas não
tive energia nem pra isso! Cheguei simplesmente acabado! O bacana foi que,
assim que cruzei a linha final, lá estavam o Helbert e o Wellerson, os dois
maratonistas que conheci na corrida, me esperando para parabenizar pela
primeira maratona.
Na chegada, a emoção ficou por conta daquelas pessoas que acordaram cedo no domingo pra ver a maratona e, embora que você nunca as tenha visto na vida, torcem por você como se fossem da sua família. Lembro de gente gritando "Falta pouco", "Parabéns!!", "Você conseguiu". Isso foi de encher os olhos.
Na chegada, a emoção ficou por conta daquelas pessoas que acordaram cedo no domingo pra ver a maratona e, embora que você nunca as tenha visto na vida, torcem por você como se fossem da sua família. Lembro de gente gritando "Falta pouco", "Parabéns!!", "Você conseguiu". Isso foi de encher os olhos.
Terminei em 22° lugar geral, 5° na minha
categoria. Foram 3h11m54s de maratona. Meu maior feito esportivo nesta vida!
Não quero desestimular ninguém, mas tenho que ser
realista. No meu caso, o final foi bem cansativo. Meu colega de trabalho e
amigo, Paulo, que estava gentilmente lá no final da prova, me viu recebendo
massagem e disse:
-PC, vim aqui te parabenizar cara, não foi pra
reconhecer corpo não!
Apesar de todo esforço e dor no final, na
terça-feira, quando a dor passou, eu comecei a experimentar uma sensação de
realização incrível. Voltei à adolescência! Eu olhava no espelho e dizia:
Consegui! Corri uma maratona!
Fiquei muito feliz de ter cumprido uma meta na
vida e muito agradecido por todos aqueles que me ajudaram em algum momento,
especialmente meu treinador Henrique, que me tirou do sedentarismo pra maratona
em menos de um ano.
Essa maratona foi tão especial, que até apareci na ESPN!
Agora é pensar no próximo objetivo!