quinta-feira, 16 de agosto de 2012

A bruxa da amoreira


Estávamos meu filho e eu comendo amoras no pé em frente de casa quando ouvimos um grito:
- A amoreira é frágil, não é pra subir.
Desci da árvore e vi uma senhora caminhando com os cachorros. Lembrando-me daquela citação "Nunca discuta com um idiota. Ele te arrasta até ao nível dele, e depois vence pela experiência”, resolvi apenas retrucar:
-Bom dia pra senhora também.
Mas ela era insistente, como costumam ser os chatos.
- Você como adulto deveria saber que não pode subir na amoreira, tem que ensinar essa criança!
Fiquei quieto e esperei a bruxa continuar sua caminhada, imbuída do espírito de estragar o prazer alheio de quem encontrasse pela frente.
Como não pude retrucar, deixo aqui algumas perguntas que gostaria de ter feito:
  • Como ela quer que eu ensine a importância de cuidar das árvores sem ele ter conhecido o sabor de comer uma fruta no pé?
  • Como ela quer que eu ensine a importância de arriscar sem que ele descubra que as melhores amoras estão mais alto, onde ninguém quis ir?
  • Como ela quer que eu ensine a importância de tomar atitude e não esperar o mais fácil sem que ele perceba que embaixo da árvore já não há nada para comer?
  • Como ela quer que eu ensine a importância de fazer tudo com atenção se ele não escorregar num galho seco e cair?
  • Como ela quer que eu ensine a importância de cuidar da saúde se ele não aprender como dói levar uns arranhões caindo de um galho?
  • Como ela quer que eu ensine a importância de cuidar do que ele gosta sem que uma amora manche sua camisa favorita?
  • Como ela quer que eu ensine a importância de ter alguém em quem confiar sem que ele saiba que pode subir um pouco mais porque eu estou embaixo pra segurar?
  • Como ela quer que eu ensine a importância da imaginação sem que aquele galho distante só possa ser alcançado por um Indiana Jones como ele?
  • Como ela quer que eu ensine a importância do dinheiro sem que aquela folha de amoreira vire uma nota de 100 num passe de mágica e possa comprar 5 amoras pretinhas?
  • Como ele vai descobrir a importância de partilhar sem jogar umas amoras pretas que ele descobriu lá no alto para quem ficou embaixo?
  • Como ele vai descobrir o amor de infãncia sem a pergunta "você gosta de amora"?
  • Como ela quer que eu ensine como é importante cuidar do nosso bairro se é em cima da amoreira que vemos como é bonito o local em que a gente mora? 
Infelizmente não tive a oportunidade de fazer as perguntas, nem de contar como na infância esperávamos ansiosos a época das amoras. De como voltávamos com a boca vermelha, camisas manchadas, pernas raladas e um saco de amora para fazer suco. Uma pena que talvez ela tenha aprendido lições de certo e errado apenas num banco de escola. Deveria ser obrigatório que todos tivessem aulas num galho de amoreira.

Renato Teixeira- Amora


 
 

 

quinta-feira, 2 de agosto de 2012

Apaixonei-me por uma amazona: e agora? Guia básico de sobrevivência




Se o máximo de contato com o mundo hípico que você teve na vida foi torcer pro "malhado" ganhar as corridinhas promovidas pelo Bozo na infância, talvez este texto possa te ajudar, caso o amor tenha aparecido a cavalo para você:
Vamos começar pelo básico.

1) Como saber se ela é uma amazona?
A resposta é muito fácil. Basta entrar no Facebook que provavelmente a foto do perfil será dela no cavalo, a foto do mural será dela no cavalo e, se quiser garantir, repare nos perfis dos amigos porque quase todos estarão a cavalo na foto.

2) Já sei que ela é amazona, e agora, o que pergunto?
É preciso bolar uma estratégia.  Perguntar "Você faz hipismo?" é um bom começo. O problema é perguntar que tipo de esporte hípico ela faz. Não pergunte "Você faz tambor?" pra quem faz hipismo clássico e vice-versa. Pode demonstrar total desconhecimento do tipo de mulher com quem você está lidando. Melhor seria perguntar "Qual esporte hípico você faz?" com a maior naturalidade possível, ainda que você não saiba diferenciar o Rodrigo Pessoa do cowboy da Marlboro.

3) Surpresa: existem outras raças de cavalo além do Mangalarga Marchador!
Se esta é a única raça de cavalo que você conhece guarde para si a pergunta. De cada 10 perguntas sobre o cavalo que ela já ouviu na vida de leigos no mínimo 9 foram se o cavalo é mangalarga marchador. 

4) Será que ela já foi pras olimpíadas? Devo perguntar?
A resposta para ambas as perguntas é: provavelmente não. Aqui outra dica importante. Como a maioria de nós só assiste hipismo a cada 4 anos, ficamos com a sensação de que só existe nas olimpíadas. Então é bom saber que nem todo mundo que pratica hipismo já foi ou irá para as olimpíadas. Imagina você na balada dizendo para uma menina que você joga tênis e ela te pergunta: Você já jogou em Roland Garros? Pois é, a proporção é mais ou menos a mesma. 

5) Baloubet du Rouet 
 Se você só lembra de hipismo por causa do refugo do Baloubet nas olimpíadas de Sydney, saiba que ele foi um dos melhores cavalos de salto de todos os tempos e que o erro foi do Rodrigo Pessoa. Colocar a culpa no cavalo pelo mau desempenho do Brasil naquelas olimpíadas não será uma boa aproximação na sua conquista da amazona. Aliás, depois da pergunta sobre a raça do cavalo, essa deve ser a segunda pergunta mais ouvida por quem pratica hipismo. 

6) Amazonas
Estava esquecendo! Amazonas é o estado, lá no norte do Brasil, ou o plural de Amazona. Perguntar "você é amazonas?" é meio analfabetismo geo-hípico e pode contar pontos negativos.

7) Será que ela é rica?
Seria meio hipócrita dizer que o hipismo não é um esporte caro, até porque um cavalo custa mais que um par de chuteiras e uma bola de capotão. Mas nem todos os praticantes têm dinheiro de sobra. Dizer que alguém é rico por que tem um cavalo é como dizer que alguém é rico porque tem um carro ou mesmo filhos. Os custos de manutenção são praticamente os mesmos. Dependendo do cavalo, é claro.

Com um pouco mais de intimidade, você já pode fazer perguntas mais bonitinhas:

8) O site do seu cavalo é .com .com .com .com .com .com .com?
Adoro essa piada, apesar de ser mais legal ouvindo do que lendo.

Uma vez conquistado o coração amazônico com essa ótima piada, deve-se atentar para uma rotina de treino diário e finais de semana na hípica. Vamos ao detalhe de uma vida a dois.

9) Prepare um espaço na casa para o material de hipismo.

Bota, espora, capacete, chicote, luvas, casacas, culotes, camisas, cinto e demais aparatos hípicos. Tudo isso exigirá um local na sua casa. A sugestão é você manter um espaço seu com carvão, lenha, machado, ferramentas, cervejas e afins para evitar que o espaço mais bruto e rústico da casa seja mantido pela sua mulher.

10) Prepare um local para os troféus.
Hipismo dá troféus e essa é uma parte legal. Prepare as prateleiras da casa!
Adendo: Nunca diga que o cavalo faz tudo sozinho. O pessoal fica muito bravo. O cavalo ajuda muito, como carro na F1, mas se alguém que não souber montar o cavalo, ele não passará nem o primeiro obstáculo.

11) Você continuará matando os insetos pela casa
Isto é incrível, mas você não demorará a descobrir. Por mais que ela faça um animal de 500 kg pular correndo um obstáculo de mais de 1,30 metro, caberá a você, companheiro, continuar matando os bichos voadores que apareçam na casa porque ela tem medo.

12) Compre gelol 
A expressão cair do cavalo vai ganhar novos contornos na sua vida. Se você não gosta de mulher com uns roxos de vez em quando é melhor largar mão logo.  

13) Prepare-se para ser fotógrafo, massagista, psicólogo, torcedor, etc..
Você ficará 5 horas na hípica e quando for a vez dela de saltar você terá que filmar e fotografar e não verá nada direito naquele 1 minuto. Depois, cabe a você consolar, aplaudir e incentivar, mesmo não entendendo nada do que aconteceu.

14) Os finais de semana na hípica
Reza a lenda que o Dalai Lama, antes de virar sacerdote, namorava uma amazona, mas não tinha paciência para ficar sábado e domingo vendo gente saltando com cavalo e por isso resolveu virar monge budista.
Prepare-se para ir para a hípica sábado de manhã e assistir 4 categorias (ainda que o instrutor tenha ligado avisando pra ela ir logo pra hípica porque já está chegando a vez dela) até chegar na da sua mulher. Depois esperar uns 20 conjuntos (que não são musicais) até chegar a vez dela. Agora é torcer para o cavalo não refugar, ela não errar e fazer valer o dia na hípica.
Material básico para essa tarefa:
- Uma cadeira de praia, porque em 99% das vezes a arquibancada estará virada pro sol, segundo a Lei de Murphy.
- Um livro, preferencialmente no começo.
- Um iphone, com carregador.
- Dinheiro para comida e bebida. Mais pra bebida.
Arranjar um amigo para conversar é também uma boa opção, mas há que atentar para o fato de que a maioria das pessoas está ali para falar de cavalo. O que faz certo sentido, porque seria como falar de inflação ou literatura no estádio de futebol.

15) E se, com o tempo, eu sentir ciúme do cavalo?
Se você estiver achando que ela passa mais tempo com o cavalo do que com você, pense duas vezes antes de falar o famoso "ou ele ou eu". Há uma expressão caipira que diz: “Cavalo bom é difícil se achar. Mulher bonita é mais fácil. Se encontra em qualquer lugar."  A lógica serve "iguarzinho" pras amazonas...

16) Fim
Se você leu tudo e achou que dá pra saltar os obstáculos de um relacionamento a três (você, ela e o cavalo) sem fazer nenhuma falta, boa pista pra você!